Excitante Cairo

“Isto é o Cairo!... Distante, Cairo! Excitante, Cairo! Apaixonante!...” cantarolava Bassam de quando em vez, alegremente, durante os oitos dias em que me acompanhou por todo o Egipto. Desde a fronteira com o Sudão, no Sul, até Alexandria, no norte junto ao Mediterrâneo, passando pela mega metrópole, o Cairo, Bassam foi o nosso guia turístico.

Nasceu junto ao Nilo, mas foi em Portugal que ouviu pela primeira vez o tema dos Táxi, de 1982. Estudou em Lisboa, onde de licenciou. Fã da pátria lusa, falava português fluentemente e com frequência recordava sítios que lhe deixavam saudades: Sintra, Alfama, Évora, Praia das Maçãs. A camisola 7, do Luis Figo, era uma das várias da selecção nacional que envergou naquela semana, enquanto nos explicava histórias de reis, rainhas e faraós. A milhares de quilómetros de distância do meu país, sentia-me em casa. Nilo acima, num barco repleto de tugas com a bandeira nacional hasteada, cantava-se “a portuguesa” à mesa, por entre ondas e outros cânticos. Bassam estava sempre lá. Sempre com um sorriso, este foi um dos guias mais simpáticos das minhas viagens.

O Egipto é impressionante. Pelo calor. Pela história. Pela paisagem. Pela cultura. Pela diferença. Guardo a imagem de um país pobre, mas calmo, seguro, amistoso.

Entretanto, pela televisão chegam imagens de revolução, morte, inquietação. Tal como a Tunísia e a Argélia, ali vivem-se momentos de mudança. As oligarquias, regimes ditatoriais, democracias militarizadas ou estados policiais, como lhes queiram chamar, pelo menos naquela parte do mundo, parecem estar perto de um “game over”.

Esta Afrorevolution tenta por fim à corrupção extrema, em que a riqueza fica toda concentrada numa só família. Segundo notícias, Mubarak terá uma fortuna pessoal avaliada em mais de 50 milhões de euros, propriedades, apartamentos por toda Europa e América, contas bancárias na Suíça, sabe-se lá o que mais… enquanto o povo egípcio está na miséria.

No coração do Cairo, a maior cidade de África (25 milhões de habitantes), a “Cidade dos Mortos” é um fiel retrato desta realidade. É um cemitério onde vivem cerca de um milhão de pessoas. Os velhos jazigos dão tecto a famílias inteiras em situação de pobreza extrema. Aqui até existem escolas e hospitais. Macabro.

No entanto, o Egipto é um país rico em recursos. As portagens do canal do Suez, por onde circula todo o tráfego marítimo entre a China, Ásia, e a Europa e Estados Unidos, são a principal fonte de receitas do país. Seguem-se o petróleo, a agricultura (só 6% do Egipto é fértil) e o turismo. Onde é que já vi este filme de riqueza mal distribuída…

Mas a paciência tem limites e a Internet deu uma ajuda a passar mensagem. Facebook e Twitter foram os principais canais dos mentores de uma revolução que se queria pacífica. Apesar do ridículo corte da Internet, no dia 28 de Janeiro, os protestos mantiveram-se. Má notícia para os países europeus que lucraram com negócios com os ditadores. O povo libertou-se. O Egipto é livre. Onde estará Bassam?

Fotos da era Mubarack (2005):










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